segunda-feira, 20 de junho de 2016

Destino, Livre-Arbítrio e Capitão América


“Haja ou não deuses, deles somos seus servos”
Fernando Pessoa

Ando cansada de ouvir noticiários. Desisti! Cansada da Lava-Jato; da palavra propina; dos argumentos no Senado; de moças dopadas. Não tenho mais cabeça para tanto fuzuê. Vou ler gibis... O Brasil dança tonto desde sempre: um passo à frente, dois atrás! Capengando, cai não cai...
A maioria das pessoas acredita em destino. Curioso que a maioria também creia em livre-arbítrio. Talvez tenhamos algum gene especifico ligado à crença. Isto justificaria a nossa tendência em crer, independente do objeto.
 A capacidade de crer é normalmente considerada virtude. O gene nos impeliria à crença, mas, a forma como nos relacionamos com ela vai além. O Brasil é um bom exemplo: quase a totalidade da população crê em Deus; tememos os castigos divinos. No entanto, esta virtude não nos impede de estar entre os dez países mais violentos do mundo.
Somos por formação, exploradores, imediatistas e ressentidos.  Brancos aventureiros, cujo principal objetivo era carregar tudo que estivesse ao alcance, misturaram-se com jovens índias, meninas, que se entregavam por um espelho. E, posteriormente, com negras escravas. A tão romantizada miscigenação brasileira...
Começo ruim, mas a questão é: poderemos mudar a nossa cultura de exploração, que vai de afanar parte de um troco a apropriar-se de bilhões? Do porteiro do condomínio ao Presidente da República todo mundo querendo levar vantagem! Se pessoas tem destino o mesmo deve se dar com países, planetas e sistemas. Será que a sina do Brasil é abrigar pessoas que sucumbem a  exploração desenfreada?  
Seriam os insondáveis passos do destino guiados por nossas escolhas, motivadas pelas circunstâncias e por nosso caráter, ou por fatalidades regidas por vontades metafísicas? Talvez as nossas escolhas definam as nossas fatalidades e mesmo os deuses se curvem a elas... Detesto contrariar Fernando Pessoa... 
Se quisermos mudar a nossa “sina”, precisaremos formar novos brasileiros, com uma nova mentalidade. Único modo de alterar as nossas escolhas.
Por hora, tento apenas trocar os telejornais por Marvel. Exerço o meu livre arbítrio com o Capitão América, só para provocar à esquerda.

terça-feira, 7 de junho de 2016

Sobre Todas as Coisas...

        Uma pessoa escreveu sobre algo que escrevi: “foi a coisa mais escrota que já li, você é uma sem noção...” Adoro quando acertam sobre mim. Em geral, por ignorância ou gentileza sempre erram. 
       Essa pessoa tem razão. Palavras não servem pra nada, no máximo para marcar reuniões de trabalho. A maioria das coisas, em especial a ofensa, poderia ser demonstrada por grunhidos ou gestos. Escrever poemas então... É o cúmulo da inutilidade! 
      Andar pela praia, escalar uma montanha, abraçar quem se ama , é muito mais que todos os poemas do mundo. É a poesia materializada...

segue outra reflexão "escrota":      

Transformar sentimento em palavras. Inútil... Para que servem palavras, poesia, sentimentos, e todo o resto? Qualquer coisa que se faça é tão nobre quanto embebedar-se.Manter-se integro e sóbrio, ou louco, ou perverso. Que deus ébrio destila estas possibilidades?
O mundo é a dose que o tempo sorve; nós, um gole que a vida cospe indiferente.  E há quem se sinta importante...

Ando às tontas em cordas bambas, para combinar com o país!  

sexta-feira, 3 de junho de 2016

O Pintor...

Então...Posto um texto que fiz em repudio ao senso comum. Aliás, mais do que senso comum, a igualdade das coisas como sinônimo de harmonia. 


               Aquela era uma cidade verde. Localizada em um país verde. Composta por bairros cujas casas, escolas, igrejas, contratos e impostos eram todos verdes. As pessoas verdes, sempre verdes, eram treinadas para pensar e agir verde. Tudo deveria ser essencialmente verde. Verde claro; verde escuro; verde musgo, quando velhas; verde oliva, quando mortas. Enterradas no cemitério verde; conduzidas verdes plácidas a um Deus verde- acetinado.
  Quando exatamente fora eleita a cor verde ninguém sabia explicar. Mas, por que pensar outras cores se era tão mais fácil seguir o que já estava estabelecido, sacramentado e enverdecido? Ora! Diziam os cultos, o verde é a cor mais adequada; palavra curta, fácil de gastar! É a cor da cura!Diziam os médicos. É a cor da relva, cantavam os músicos... Tudo era tão harmonicamente verde quanto uma mente verde pudesse imaginar.
Um dia, por erro da natureza, nasceu um menino esquisito. Ele nascera todo deformado, colorido! O cabelo de cachinhos amarelos; a pele rosa e macia como pétalas! E os olhos?! Ah! Os olhos eram de um azul tão profundo... Tão infinitamente azuis!
Ao vê-lo os pais sentiram desgosto, mágoa e pena. Levaram na igreja; no curandeiro. Leram livros; viajaram; rezaram; prometeram! E nada surtiu efeito... Pois o menino crescia em graça, cor, e brilho.
-Como criar um filho com tantas cores em um mundo verde? Pintavam-no de verde, mas, sempre havia algum vizinho maldoso que investigava:
- É mesmo verde esse menino?
 Cansado de ficar em casa escondido, o jovenzinho partiu... Ele foi andando pelas ruas verdes, olhando nos olhos das pessoas que se viravam perturbadas. Um velho, já verde-cinza, lhe disse consternado:
- Filho, não faça isso! Sair na rua colorido é muito arriscado!
- O senhor não conhece outro multicor?
- Não vos disse nada, mas, há outro que mora isolado, muito mais sensato, a quem chamam pintor.
O jovem de alma revigorada saiu em busca do pintor. Ele certamente o entenderia; ele certamente aliviaria a sua dor.
 Ele foi se afastando da cidade verde. Deixando para trás toda unanimidade. E na medida em que seguia surgiam infinitas cores. Eram flores, bichos, galhos, rios, compondo paisagens insuspeitadas. As cores eram tão vivas que de repente sentiu-se pálido.
-Então é isso! E enquanto contemplava viu de longe o pintor que procurava.
Porém, antes que dissesse qualquer palavra, o homem virou-se; foi até ele; abriu um largo sorriso; entregou-lhe o pincel e disse:
- Até que enfim um talento! Que bom que veio, eu te esperava!  

(Patrícia Ubert)