Os
grotescos homicídios em massa perpetrados pela Alemanha nazista começaram com
meras restrições. As ideologias mais perversas, religiosas ou não, sempre se
impuseram paulatinamente. A liderança alcançada através do fanatismo possui um modo
de agir similar ao dos répteis: é disciplinada e estrategista.
No
mundo rasteiro destes humanos a coação se deu em doses progressivas. E os
frascos venenosos foram sempre revestidos com o rótulo da boa causa. Às vezes alegaram
a superioridade da sua raça ou ideologia; às vezes julgaram-se os eleitos de
uma divindade.
A
polêmica decisão de um juiz do DF que reconheceu a possibilidade da reversão da
sexualidade, considerando via homossexual para a heterossexual, foi movida por
uma convicção que amplia a liberdade do cidadão ou contém apelos fascistas?
Antes de discorrer sobre esta questão é
preciso fazer uma análise simplista: A palavra reversão significa retorno, ou
seja, volta ao que era desde o inicio. Logo, ninguém poder ser- menos ainda
voltar a ser- o que nunca foi.
Imagino que estes psicólogos favoráveis à “reversão”
estejam convictos de que ninguém nasce homossexual, o que equivale: todos os
seres humanos são essencialmente heterossexuais. Suposição que não possui
fundamento científico; sequer empírico, já que os milhões de homossexuais em
todos os continentes, em todas as épocas, nos permitem observar e concluir que
se dá justamente o contrário.
Não
dá nem para dizer que é culpa da Rede Globo, pois ela não existia quando um dos
nossos ancestrais primatas deixou claro que preferia a companhia de outro macho
a de uma fêmea que roçava nele insistentemente.
Negar
a homossexualidade como uma das várias possibilidades congênitas da nossa
espécie é no minimo admitir que a heterossexualidade é extremamente vulnerável
a fatores extrínsecos, e, pior, inexplicáveis.
Mas,
não se trata de aceitar os fatos ou de negá-los. Trata-se de como os psicólogos
irão “reverter” os seus pacientes sem infligir-lhes medo e culpa por sentirem
o que sentem. Em crianças e jovens isto poderia ser devastador. Sobretudo,
porque todos sabem que muitos grupos religiosos se enriquecem justamente à
custa do medo e da culpa alheia.
Voltemos
à questão: fez bem o juiz em entender que impedir psicólogos de oferecerem
tratamento a eventuais pacientes que acreditem na “reversão” da sexualidade é
uma restrição? Sim, fez bem. Desde que alguém, maior de idade, vá dormir hétero e misteriosamente amanheça homossexual, sentindo-se desconfortável com seus
inusitados desejos; desde que o “tratamento” não inclua métodos que comprometam
a sua saúde física e mental; desde que a “cura” não seja patrocinada pelos
cofres públicos... E, principalmente, desde que não seja motivada por grupos
que visam privar pessoas de exercerem seus direitos, emoções e afetos, quando
não coincidentes com as verdades que pregam.
Do
contrário, a sociedade brasileira caminhará para o segundo passo da estratégia. Ele será a imposição do tratamento. No caso
de recusa ocorrerá o segregamento e a humilhação; após, a restrição de
direitos, que incluirá a censura, o fechamento de bares, boates, restaurantes...;
depois, um pouco mais a frente, se dará a criminalização de todas as práticas
consideradas imorais; por fim, a condenação do infrator tanto no céu quanto na
terra. Exagero? Talvez... Mas, muitos judeus acreditaram que se abrissem mão de
alguns direitos seriam deixados em paz.